Estamos em um ano sabático para conhecer o mundo e a nós mesmos. Para isso manteremos nossos olhos, mentes e corações atentos e abertos por onde estivermos. Toda semana faremos um relato do que passou e por onde passamos. Como tudo na vida tem dois lados, serão duas visões sobre os mesmos momentos.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Kyoto, Hiroshima e despedidas

Bom pessoal,

Chegamos em Quioto no domingo à tarde e fomos direto para o hotel ou melhor para a Ryokan: tradicional pousada japonesa. Os sapatos ficam na porta de entrada (que nunca é trancada mesmo sem ninguém na recepção), o quarto é de tatame e o colchão é um futon, a mesa é baixa e senta-se no chão, o banheiro é compartilhado e a cozinha está a disposição de todos, inclusive da família que é dona e mora também ali. Eles usam as mesmas facilidades. Nosso quarto era grande e ficamos eu, a Raquel e a Ligia em um e a Tia e o Marques em outro. Ficamos no térreo perto do banheiro e da cozinha. Em relação a hospedagem uma das melhores experiências que já tive. Muito tradicional no Japão. Quioto foi a capital do Japão mas é a eterna “Velha Capital” e a “Cidade dos Samurai”. Musashi viveu aqui. O primeiro jantar tinha que ser especial: comemos sashimi em um restaurante chique, caro e delicioso. Os melhores peixes até o momento.

Ficamos apenas 4 noites e tivemos que escolher o que ver e o que deixar para a próxima vez pois é impossível ver tudo em tão pouco tempo. Além disso, nesse mesmo período ainda tinha o maior festival da cidade (e um dos três maiores do Japão), o Gion Matsuri. Elencada as prioridades, no dia seguinte seguimos para o Templo Dourado. Um pequeno templo, dourado, que com o a luz do sol deve até cegar (mas estava nublado), no meio de um lago e cercado de um belíssimo jardim. De lá seguimos para a Rua de Bambu que é quase fora da cidade. Valeu pelo inusitado, mas é apenas uma rua com bambuzal dos dois lados que transforma toda a área numa verdadeira floresta amazônica de tão abafada e quente que fica. E ainda bem que o dia estava nublado. Seguimos então para a parte central da cidade para almoçar, comemos um Tonkatsu maravilhoso e voltamos para a ryokan para descansar pois o dia estava realmente quente e abafado. À noite fomos para a primeira noite do Gion Matsuri. Muitas barraquinhas de comidas nas ruas, muita gente e também os carros alegóricos com suas lanterna e cores. Mas nesse dia as principais ruas ainda estavam aberta para os carros.
Templo Kinkaku-ji, o Templo Dourado

Rua de Bambu
 No dia seguinte fomos para Nara, cidade que tem um dos templos mais importantes e antigos do Japão, o Todai-ji. O Tori da entrada do templo já impressiona e quando você entra no pátio onde está o templo é tudo muito grandioso. É tudo gigantesco. É impressionante. O tamanho das portas, a altura, os detalhes, tudo. E dentro do templo tem o maior Buda que já vi. É o maior Buddha Vairocana de bronze do mundo (http://www.sacred-destinations.com/japan/nara-todaiji). Ali orei, agradeci por tudo e pedi mais um pouquinho de proteção. Nunca é demais. Depois seguimos um roteiro sugerido pela Ligia: Osaka, a segunda maior cidade do Japão. Compramos bentô na estação de Nara e pegamos o trem. Chegamos em Osaka e seguimos direto para o mercado de rua chamado Namba. E mais uma vez me surpreendi com uma rua só de comidas, só de restaurantes. Cada restaurante mais chamativo que o outro com caranguejos, polvos e baiacus gigantes nas fachadas. Osaka é conhecido pelas comidas e comemos num restaurante de esteirinha (aquele que os sushis vem em pratinhos numa esteira que passa por todo o restaurante). Osaka foi uma grata surpresa pois não estava no roteiro. Voltamos para Quioto de Shinkansen e ficamos na ryokan esta noite.

Templo Todai-ji

Buddha Vairocana de bronze






No dia seguinte seguimos, somente eu e a Raquel, para conhecer a floresta com 10.000 Toris vermelhos. O lugar chama Fushimi Inari Shrine e é ponto obrigatório. A estação de trem é bem em frente ao templo principal e início dos Toris que estão coladinhos um no outro fazendo um corredor montanha acima. E dá-lhe escada. No total foram quatro quilômetros num calor dos infernos (suei tanto que parecia que tinha feito xixi nas calças). Nos encontramos novamente com os três em Quioto e seguimos para conhecer os 1001 Budas no Sanjusangedo Hall e depois fomos para mais um impressionante templo: o Kiyozumi-dera. Um templo suspenso por toras de madeira na beira de um penhasco. Bem em baixo dele tem uma fonte onde se encontra a água mais pura do Japão de acordo com a tradição. Entramos na fila e enchemos nossas garrafas. Naquele calor poderia colocar uma rede debaixo da fonte e ficar o resto do dia. 
Fushimi Inari Shrine
Templo Kiyozumi-dera
 À noite fomos na festa de rua da véspera do dia do desfile, que o ponto alto do Gion Matsuri. As ruas estavam lotadas de gente e barraquinhas de comida. Agora todas as ruas estavam fechadas e havia tanta gente que tinha até mão e contramão para se caminhar. No outro dia fomos ver o desfile dos carros que eram puxados por mais de 30 homens. O carro é tipo uma carroça gigante, alta e no topo tem uma bandinha. E o melhor de tudo é ver eles fazendo a curva no final da rua, já que o carro não tem giro. Eles literalmente arrastam o carro de lado encima de esteiras de bambu ao som dos sinos e tambores e dos huuuuu e aplausos dos espectadores. Nesse mesmo dia fomos para Hiroshima com a Tia e o Marques e tivemos nossa primeira despedida. A Ligia voltou para Tóquio e no dia seguinte voltou para Nova York onde mora. Foi muito bom ter sua companhia nesses dias no Japão. Primeiro pela companhia, segundo pelas bebedeiras e depois pelas traduções em supermercados e restaurantes. Andar com tradutora deixa tudo mais fácil. Arigato Gozaimasu.

Gion Matsuri
Em Hiroshima, no dia seguinte fomos primeiro conhecer a cidade de Miyajima onde tem um Tori e um templo no mar. Quando a maré sobe o templo fica como se fosse uma ilha. Tudo em vermelho alaranjado bem chamativo. Muito bonito. E depois do almoço fomos conhecer o museu da Bomba Atômica e depois o Domo, que resistiu aos efeitos da explosão apesar da proximidade, em Hiroshima. 

Miyajima
Tori gigante
A bomba, lançada ha 69 anos atrás, teve um efeito devastador na cidade. Mais de 140.000 pessoas morreram antes de completado o primeiro mês. Menos de 20 prédios em um raio de 2Km ficaram em pé. Foi um ataque surpresa, sem aviso prévio. Hoje o Japão reconhece o mal que fez em outros momentos de guerra e acredita que isso foi uma lição (está no museu). Hoje não existe exército no Japão. Na Praça da Paz existem dois monumentos principais (além do Domo): o primeiro é um altar seguido de um espelho d´água e depois uma chama eterna. O espelho d´água é uma lembrança a todos aqueles que morreram por falta de água. Muito simples e muito forte. E o outro é um sino com um Tsuru embaixo. Tsuru é um origami de uma ave sagrada, diz a lenda que ela vive 1.000 anos e caso você faça mil origamis, você terá um desejo atendido. E virou símbolo de esperança e perseverança depois da história de uma menina que viveu aqui. Quando a bomba estourou, Sadako tinha dois anos e aos 12 descobriu que tinha leucemia. Ela escutou sobre a lenda e passou a fazer os origamis na esperança de sobreviver. Ela morreu antes de completar os 1.000 Tsurus dos efeitos da radiação. Mas os amigos terminaram e ainda fizeram uma campanha de arrecadação que juntou dinheiro e construiu o monumento na praça. Já fiz muito Tsuru uma vez. A Talita, minha sobrinha japonesa, teve um momento muito difícil e toda a família fez Tsurus para ajudar. Fizemos no total uns 4 mil Tsurus. Na saída do hospital ela doou três mil Tsurus para as outras crianças pois ela só precisava de mil. Ela tinha apenas 8 anos. Hoje ela é uma moça, linda, está na universidade, namorando e só os pais, Edidio e Sayuri, acham que ela ainda é um bebê. Coisa de pai e mãe.

O Domo
Praça da Paz
Tsuru
No dia seguinte chegou o momento de se despedir da Tia e o Marques. Eles foram para Tóquio e nos para Fukuoka e depois Ishigaki, Okinawa. Seguimos para a estação, compramos um bentô e nos despedimos com um grande aperto no coração. Foi muito especial encontra-los no Japão, escutar as histórias dos seus pais e conhecer um pouco mais dessa família que me adotou.

Valeu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário