Estamos em um ano sabático para conhecer o mundo e a nós mesmos. Para isso manteremos nossos olhos, mentes e corações atentos e abertos por onde estivermos. Toda semana faremos um relato do que passou e por onde passamos. Como tudo na vida tem dois lados, serão duas visões sobre os mesmos momentos.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

A tão temida Índia:Delhi e Rishikesh

Índia, Índia... difícil falar sobre ela... a escrita não é fluida como costuma ser, mas sim fragmentada por vários sentimentos que ela nos causa. A Índia mexe com nossas emoções sem dó nem piedade. Ela causa desconforto em ver a pobreza e a sujeira escancaradas a céu aberto, desconfiança das pessoas que te encaram fixamente e a qualquer momento podem te aplicar um golpe, apreensão do trânsito caótico onde você acha que vai morrer a cada 5 minutos com o carro andando na contra mão e buzinando o tempo todo para os outros, que estão na mão certa, saírem da frente. Leva-se um tempo para processar tanta informação...

Dessa vez decidimos contratar um pacote com hotéis definidos e motorista particular todos os dias. Não gosto dessa opção, me faz sentir numa bolha, vendo as coisas lá de cima, não podendo sentir e viver o lugar. Mas foi a alternativa que nos daria respaldo e segurança para poder relaxar, à medida do possível, e ver se encontramos beleza por trás do caos eminente.

Delhi, nosso hotel estrelado é o Krishna, logo atrás

Chegamos por Delhi e no primeiro dia queríamos apenas “sentir” a cidade, fazer aquele reconhecimento de terreno tradicional que o Lucio sempre fala. A ideia era pegar o metro e dar uma voltinha, mas o dono da agência recomendou que fôssemos de motorista já que éramos novos no país. Fomos para Old Delhi onde pegamos um riquixá e andamos pelo Red Fort e Jama Masjid, a maior mesquita da Índia. O desconforto da chuva que começou assim que subimos no riquixa, mais o choque do nosso primeiro contato com a realidade fez com que o passeio fosse bem rápido, só para dar uma espiada.

No outro dia dispensamos o motorista para ter mais liberdade e fomos de metro. Tão cheio quanto o de São Paulo, com a diferença que existem vagões só para mulheres e os demais são mistos. Nem pensei na possibilidade de me separar do Lucio e ir no de mulheres, então fomos no misto que na verdade quase só tem homens. Difícil de se sentir à vontade. Aliás esse é um dos meus incômodos na Índia, só se vê homens, e muitos. Não vi uma mulher trabalhando, mesmo em funções tipicamente femininas como limpeza e cozinha. Asiática então, devo ser a única no meio dos 1,2 bilhões de indianos. O metro funciona, mas a tensão é uma constante principalmente quando chega e sai da estação, onde a vizinhança não é das melhores. Nem pensar em pedir informação e demonstrar que estamos perdidos, o negócio é andar para qualquer lado fingindo saber onde está. Fomos conhecer o Tempo de Lotus, da religião Bahai, aberto a todos, independente da religião que se pratica. Lá dentro não se tem nenhuma imagem para adoração, apenas um ambiente silencioso para cada um rezar a seu modo. Depois fomos para Connaught Place, a região central e mais arrumada da cidade. Seguimos a indicação de um restaurante do Lonely Planet e, apesar de caro, achávamos que merecíamos depois de nos aventurar pelo metro de Delhi.

Lotus Temple

Ok, já sabemos como é o metro mas com motorista é bem melhor. Assim, iniciamos o dia pelo templo Gurdwara Bangla Sahib e foi aí que descobri que as cores podem ser o contraponto da paisagem agressiva da Índia. O contraste do branco do templo com as cores das roupas despertou meu olhar que estava adormecido há 2 dias. A religião sikhs é praticada por 2% da população e prega a união das pessoas onde todos são iguais e bem vindos. Todos o dias voluntários preparam comida para distribuir de graça para qualquer um, independente de onde veio ou de qual classe social pertence. Pudemos conhecer a cozinha e ver centenas de pessoas almoçando. Se quiséssemos poderíamos comer também, mas ainda estava muito cedo para interações. 

Templo Gurdwara Bangla


Refeição para todos

Depois fomos conhecer o Humayuns Tomb que inspirou o Taj Mahal, muito bonito. E por fim o Tempo Akshardham, recém construído em 2005, onde vimos pela primeira vez um buda na Índia, o mesmo que vimos em Hong Kong, mas dessa vez com cara indiana. O templo é enorme, tem esquema rígido de segurança e não se pode tirar fotos. Bonito, mas eu achei grandioso demais para ser um lugar para reflexão.

Humayuns Tomb

Tivemos o primeiro furto da nossa viagem. No templo Gurdwara abriram a minha mochila e levaram minha nécessaire. Nada demais, basicamente alguns remédios de emergência, mas ficou aquela sensação ruim de invasão. Um aviso para ficarmos mais atentos.

De Delhi fomos para Rishkesh, a cidade mundial da yoga onde o Rio Ganges ainda é limpo e pode inclusive banhar-se nele. Bem menor e mais tranquila que Delhi, passamos uns dias em meio à natureza, macacos, vacas, sadhus (santos) e bichos grilos que passam meses meditando e comendo comida vegetariana.

Nós 2 em Rishikesh: Ram Jhula

 Lakshman Jhula
Templo ao lado da Lakshman Jhula

Aliás a comida indiana é irresistível em seu aroma e sabor. Quem precisa de carne com as especiarias da Índia e os pães naan sempre frescos e quentes? E quem precisa de talher se o melhor é comer com a mao usando o pao como apoio? Só paramos de comer o curry indiano quando chegou nossa primeira dor de barriga da viagem. Ficamos de molho uns dias deixando nosso organismo se acostumar com as novas bactérias.

Curry de vegetais

Frango e carneiro ao curry e pao naan

Acompanhamos uma cerimonia religiosa na margem do Rio Ganges no pôr do sol. Foram 30 minutos de reza cantada e no final as pessoas fizeram oferendas de flores e velas sobre o rio. Enquanto ia ouvindo a cantoria me lembrei de ter lido que em uma das vertentes religiosas daqui, não se faz pedidos, e sim agradece o que se tem. E foi aí que me dei conta que na minha andança pelo mundo já fiz muitos pedidos, pedi para as estrelas, para Alá, para Buda, para Jesus. Mas nunca agradeci. Aproveitei então para agradecer, simplesmente por estar aqui, nesse país tão bruto, vendo um mundo tão diferente e aprendendo a lidar com um sentimento a cada dia. E vamos caminhando...

 
Cerimonia às margens do Rio Ganges

"A Índia também pode ser poesia", falei para o Lucio quando tirei essa foto antes da cerimonia religiosa

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