Laos foi um lugar para deixar o tempo passar no
meio da paz e da tranquilidade. É verdade que não se tem nenhuma grande atração
turística, mas a simplicidade e a gentileza desse povo nos faz querer estar lá,
simplesmente por estar.
Existe uma risada gostosa por todos os lados,
aquela risada com vontade porque realmente é verdadeira. Talvez porque, apesar
da pobreza, parece que o que é mais importante, a família, está sempre por
perto. Crianças cuidam de crianças, mães cozinham para a família, pais brincam
com os filhos, todos cuidam dos idosos e todos estão juntos sempre. O governo
incentiva que todos tenham o seu próprio negócio, que em geral é uma vendinha,
bem vendinha mesmo, na porta de frente da casa. E passam o dia lá, sentados num
banquinho, conversando entre eles, entre os vizinhos, almoçam e jantam na
calçada todos juntos, sem pressa pra nada.
Da fronteira da Thailandia fomos de barco até
Luang Prabang, uma viagem de 2 dias descendo o Rio Mekong. Um barco que foi
lento, desviando das pedras, em meio à natureza, legal no começo mas no final
do primeiro dia já estava entediada achando que era melhor ter ido de ônibus
pela metade do tempo. Ainda bem que o Lucio me lembrou que estamos no nosso ano
sabático, sem pressa, para curtir, e afinal, quando teríamos a oportunidade de
viajar de barco de novo? E assim fomos, no ritmo do barco, até nosso primeiro
destino.
Luang Prabang é um charme, uma cidade toda
arrumadinha que mantém sua fachada da época da colonização francesa. Andando
pelas ruas existe uma paz difícil de explicar, ruas limpas, silenciosas,
templos e escolas para monges, tudo isso envolto pelos rituais budistas como a
ronda das almas, o tocar dos sinos às 4 e às 16 horas, a reza às 18 horas.
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Ponte ligando as vilas de Luang Prabang |
A ronda das almas é muito bonita, os monges
passam todas as manhãs lá pelas 6 horas pelas ruas da cidade, descalços e com a
cesta para receber os alimentos doados pelos moradores. Talvez mais bonito que
isso é a devoção das senhoras que acordam mais cedo ainda para preparar o stick
rice e os esperam nas suas portas todos os dias. Fomos ver o ritual 3 das 6
manhãs que ficamos na cidade.
Desde a Tailandia tenho observado e pensado nos
monges. A ideia que tinha era de um senhor oriental serio que vivia apartado de
tudo, um ser soberano que vivia de ar. O que vi em minha andança por aí são jovens,
risonhos, brincalhões, jogam bola, alguns fumam, todos tem celular, fazem
turismo, compram lembranças. Em LP se tem muitos estudantes de monges, uma
forma dos meninos terem boa educação já que as escolas são caras. Eles precisam
de cerca de 6 anos para completar a formação. Muitos não se tornam monges, mas
quase a maioria dos homens estudaram nos templos em algum período de suas
vidas.
O mercado noturno é outra atração gostosa, uma
rua grande que se transforma à noite com as barracas vendendo roupas, lenços,
pinturas e souvenires. As laosianas são muito cuidadosas, arrumam cada detalhe
da sua barraquinha, não ficam gritando querendo chamar os turistas, e não fazem
qualquer negócio, valorizam suas mercadorias sendo justas no valor. Fomos lá
quase todas as noites.
Ficamos 6 dias na cidade, “presos” esperando o
tempo de processamento do visto vietnamita. Andamos por ali, de um lado do rio,
do outro lado do rio, visitamos alguns templos e fomos conhecer a cachoeira
Kuang Si, distante 45 minutos da cidade. Uma cachoeira muito bonita que ao
longo do caminho vai formando varias piscinas de calcário.
A comida é muito boa. Eles usam várias ervas,
principalmente o capim limão e o coentro. O sabor é intenso mas suave, sem
pimenta, e como acompanhamento, se não o principal, é o stick rice, um arroz
bem grudento parecido com o motigome mas mais duro. O melhor de tudo é comer
com as mãos, faz umas bolinhas de arroz com a mão, junta com a comida que em
geral não tem muito liquido e manda ver. Ah, porcausa da colonização francesa
tem muitas padarias com baguete. Matamos saudades de um pãozinho francês.
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Frango com legumes e leite de coco, delicia! |
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Peixe do Rio Mekong, divino! |
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Frango com bambu frito, sensacional! |
De lá fomos para Nong Kiaw, uma vilazinha a 3
horas e muitas curvas de Luang Prabang. Ela é bem pequena, cercada de
montanhas. Faz muito frio, já tinha me esquecido da sensação do frio e quase
não tenho roupa já que depois do trekking do Nepal despachei quase tudo de frio
que tinha. Subimos no view point, uma caminhada de 1h30 para uma visão
espetacular da cidade, lindo. Depois alugamos uma bike e fomos andar por aí,
parando para conhecer uma caverna no meio do caminho e passando por algumas
vilas locais.
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Vista do view point |
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Nós 2 na ponte da cidade que liga o lado turístico e o lado local |
Porque simplicidade pouca é bobagem fomos mais
para o interior ainda, em Muang Ngoi, outra vilazinha a 1 hora de barco de Nong
Kiaw. Até o ano passado não tinha energia elétrica e hoje, apesar de ter um
lado turístico com pousadas e cardápio em inglês, ainda mantem muito do seu dia
a dia sem interferências ocidentais. A rua principal é a única da cidade, de
terra, com casas muito simples, todas com um mini comercio na frente. À noite
eles acendem uma fogueira e juntam a família toda em volta para comer e se
aquecer. Caminhamos um dia todo para conhecer uma caverna e mais adiante uma
vila mais simples ainda, com casas de palhas, mesmo assim cada uma com sua
lojinha na frente, fogareiro, família reunida, jogo de bola, meninos brincando
de pião, cada um no seu ritmo. Comemos em um restaurante, na verdade o único da
vila, onde a senhorinha foi buscar na horta os legumes que iríamos comer. Não
tem como um simples fried rice com ovo e legumes não ser sensacional.
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Rua principal |
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Hill Village |
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Vendinha na frente de casa |
Voltamos de barco para Nong Kiaw e de lá fomos para San Neua, uma cidade fria no meio da montanha, distante 10 horas, muitas curvas e muita poeira. As estradas do Laos são as piores que já andamos, vão contornando as montanhas e de tempos em tempos passamos por uma vilazinha aqui outra ali. Paradas para banheiro é no meio da estrada, cada um vai atrás do seu matinho e se arranja por lá. Uma diversão.
A atração de San Neua são as cavernas de Vieng
Xai, distante 1 hora da cidade. Foi lá que o governo comunista conseguiu se
proteger dos constantes ataques dos Estados Unidos entre os anos de 1964 e
1973. Casas, escolas, hospital, sede do governo, tudo funcionava nas cavernas
da região onde o povo se escondia. Uma história tão recente ainda carrega suas
marcas, algumas bombas que não explodiram no lançamento representam riscos para
a população e o solo só deve se descontaminar daqui a 20 anos. Esse período foi
conhecido como Guerra Secreta porque na época todos os olhares eram para a
Guerra do Vietnã, mas a verdade é que o Laos foi o país mais bombardeado da
guerra.
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Sala de estar em uma das cavernas que era escritório político |
De lá atravessamos a fronteira para o Vietnã em
outra viagem de 10 horas. Quando a viagem é longa e inclui uma fronteira, em
geral os ônibus são bem ok. Bom, não foi esse o caso, pegamos um micro ônibus
bem velhinho, apertado e abarrotado de laosianos e vietnamitas. Claro, naquelas
estradas um ônibus grande não conseguiria andar. E lá fomos nós, para a estrada
mais poeirenta e esburacada que já andamos, com direito a ônibus quebrado e
saquinhos de vômitos sendo jogados pelas janelas. Diversão garantida, para
eles, assistindo os dois turistas no meio da poeira. Ah, quando vamos ter
oportunidade de viajar assim de novo?
E assim foi o Laos, curtimos o país sem pressa,
em meio à paz, tranquilidade, monges, montanhas, frio, estradas empoeiradas,
comida boa e gente do bem. E como isso faz bem. Bem pra alma, bem pro coração.
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