Faz 6 meses que iniciamos nossa volta ao
mundo. Já foram 10 países, 6 fusos horários, 10 moedas, 10 maneiras diferentes
que aprendemos a dizer olá e obrigada. Acho que esse momento, a metade da
viagem, é o melhor pois já aprendemos a ficar “malandros” na arte de viajar e
ainda temos um bom caminho pela frente.
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Nós 2 em Santorini, Grecia, curtindo o por do sol |
Já sabemos como procurar os melhores hotéis
dentro do nosso budget, sempre privilegiando a localização que deve ser perto
de transporte publico e das atrações turísticas. Nossos hotéis variam de
simples a super simples. Às vezes pode ser uma categoria acima ou abaixo que é traduzido
como “super ok” ou “super simples mesmo”. Nunca ficamos em dormitório dividindo
o quarto com outras pessoas mas já ficamos em quartos com banheiro
compartilhado, poucas vezes. Em uma dessas, foi na guesthouse de Ishigaki no Japão,
me deparei com a primeira barata da viagem. Era de noite, abri a porta e ela
estava lá, enorme, no meio do banheiro, me olhando. Só fechei a porta, chamei o
Lucio que foi lá, olhou e disse “é grande mesmo”, e troquei de banheiro. Ainda
bem que não era banheiro privativo se não, não ia conseguir dormir. Barata,
barata mesmo foi só essa. Teve outro hotel, em Chengdu na China, que ficamos em
um quarto super ok, era grande, tinha uma mini cozinha e máquina de lavar
roupa. O único problema é que o prédio era velho e tinha um monte de baratinhas
andando pelo quarto. São os perrengues de uma viagem low cost... Mas no geral
eles tem tudo que precisamos: cama (às vezes com lençol duvidoso, no começo
ficava super encanada, agora nem ligo), banho quente (às vezes o conceito de
banho quente varia de um país para outro) e free wi-fi (às vezes a conexão é
tão lenta que seria a mesma coisa de não ter). Além disso já é considerado mimo
de viagem.
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Hotel de Marrakesh, Marrocos, o primeiro de nossa viagem, super simples. |
Usamos qualquer meio de transporte para ir
de um canto a outro. Em geral escolhemos o mais barato que implica em ser o
mais longo e mais desconfortável. Às vezes as viagens são longas, bem longas, e
então optamos pelo deslocamento noturno que faz o tempo passar mais rápido e
economiza uma noite de hospedagem. Além dos tradicionais avião e ônibus, já
viajamos também de ônibus cama, trem cama e navio cama. Precisamos só de 5
minutos para nos acostumarmos com o espaço e depois dormimos como crianças.
Sempre vale a pena a experiência.
Quando iniciamos a viagem tínhamos todos os
hotéis reservados e passagens aéreas compradas para os próximos 3 meses. E a
ideia era essa, ter sempre certo e seguro o próximo trimestre. A verdade é que
isso não durou muito tempo, durou só os 3 meses que já estavam programados. Com
o decorrer da viagem passamos a ter apenas 1 mês resolvido pra frente. E hoje
chegamos nas cidades sem hotel reservado e sem saber exatamente quanto tempo
ficaremos por lá. Estamos mais relaxados, querendo aproveitar melhor o agora,
se estiver bom ficamos, se não, vamos embora.
Essa eu já sabia antes de viajar: comer me
faz muito feliz. E nessa andança pelo mundo tenho experimentado sabores e
aromas que levam minha alma para o céu. Gosto de pesquisar sobre a comida local,
procurar receitas, tentar distinguir todos os sabores para poder cozinhar
quando voltar pra casa. O único sabor que não consegui decifrar foi a culinária
indiana com seus mil temperos que formam o curry, essa não vai dar para fazer
em casa. Comemos em lugares simples, quanto mais cara de local melhor no sabor
e no preço. Nossa única regra é que tem que ter movimento para ter rotatividade
da comida. O outro lado da história é que comer 2 vezes por dia, todos os dias
em restaurantes também cansa. Tem dia que não queremos nada, tem dia que só
queremos comida de casa e tem dia que passamos no supermercado e compramos
cerveja e pacotinho de batata frita de janta. Aliás engordar é uma das últimas
preocupações que eu tenho nesse sabático. Aquela minha vida mega saudável que
eu tinha em SP ficou em SP. Já engordei na Grecia e no Japao, emagreci na India
(novas bactérias) e no Nepal (devido ao trekking), e estou engordando de novo
na Tailandia. Feliz, feliz...
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Um de nossos restaurantes, com pé na areia, comidinha local e cerveja, do jeito que eu gosto, Em Koh Tao, Tailandia. |
Se eu tivesse um dia no Brasil pra matar a saudade
da comida meu dia seria assim: de café da manhã café coado, pao francês com
mortadela e pao de queijo com requeijão. De almoço churrasco com oniguiri (bolinho
de arroz japonês) e vinagrete da minha mae. Cerveja, claro. E à noite pizza delivery
da Peperoni (pizzaria do lado de casa) e um vinho argentino ou chileno. Fiz
essa brincadeira com o Lucio e ele disse que o café da manha seria no Rato’s,
um botequinho do lado de casa, com pao francês com requeijão na chapa e
coxinha. De resto seria igual, trocando o oniguiri por baião de dois. Rodamos o
mundo mas nossas raízes permanecem...
Sobre cuidados pessoais, a única coisa que
me preocupava era saber cortar as unhas do meu pe, que eu sempre deixava a
cargo da minha podóloga querida, a Sayuri. Depois de umas aulinhas e com os
instrumentos que ela me emprestou, tenho conseguido corta-las sem encrava-las.
O cabelo ainda não cortei, saí do Brasil com o cabelo tão curtinho que agora ele
está do tamanho que eu estava acostumada. Acho que dura mais uns meses. O mesmo
não posso dizer do Lucio, que também não cortou o cabelo desde então. Imaginem a
cara de Bozo dele... De maquiagem trouxe lápis de olho, rímel e batom. Só. E o
que antes era impensável, sair de casa sem lápis e rímel, hoje é rotina. No
começo não gostava de me ver de cara limpa, agora acho que faz parte do meu
estado de espirito.
Inglês é nosso meio de comunicação, além da
mímica e do sorriso. Quando começamos a viagem, sempre que tinha opção entre
inglês e espanhol, escolhíamos espanhol. Hoje é muito mais fácil falar em
inglês. Apesar de conseguir conversar com todas as nacionalidades sinto falta
de ter um inglês melhor para poder rir das piadas do pessoal que tem o inglês como
língua mãe. Encontrar brasileiros é uma raridade, e quando ouvimos o português
é como musica para nossos ouvidos, como faz bem. Uma vez encontramos um
brasileiro na India e saí tonta da conversa de 10 minutos que tivemos. Falamos
tão rápido e de tantos assuntos... já tinha perdido o costume de falar na minha
própria língua com outras pessoas que não o Lucio. Se estamos com outra pessoa,
até entre nós falamos em inglês, um barato.
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Uma das minhas fotos favoritas, menina brincando, no trekking no Nepal |
No meu ultimo dia no Brasil comprei um
e-reader, a melhor aquisição que poderia ter feito. Gosto muito de ler, embora
no dia a dia deixe isso de lado. Aqui, com o tempo a meu favor, tenho lido
muito, já li mais de 20 livros. Às vezes leio livros que me fazem entender um
pouco mais da cultura local e outras leio aqueles romances de mulher, total
agua com açúcar que não agrega nada se não felicidade. O muçulmano e a judia,
As boas mulheres da China, Jardim de Inverno e Mel e amêndoas foram os melhores
da viagem até agora, daqueles que eu fiquei tão fascinada que não consegui
parar de ler enquanto não terminaram. Adoro isso.
Já deixei pelo caminho 4 camisetas, 1
papete, 1 bota de trekking, 1 canga, 1 malha de frio. Comprei 2 camisetas. No
total tenho uns 10 kilos entre roupas, necessaire, eletrônicos e tudo que eu
possa precisar no período de 1 ano. Minha casa nas costas. Cada coisa já tem o
seu lugar, arrumar e desarrumar a mala é tarefa de 10 minutos, sem brincadeira.
No começo da viagem sempre procurávamos lavanderia para dar um trato nas nossas
roupas. Depois de alguns meses descobrimos que o mais prático é ir lavando aos
poucos na pia do banheiro. E assim temos feito.
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10 Kilos divididos na mochilona (8 Kg) e mochilinha (na frente), em Railay Beach, Tailandia |
Logo que chegamos em um país, passamos uns
2 dias fazendo a conversão da moeda local em dólar para saber se é caro ou
barato, até nos acostumarmos com o novo padrão. Nesses 2 primeiros dias é
inevitável fazer comparações com o país anterior, por exemplo, uma cerveja na
China custava 0,5 dólares no supermercado. Na Índia, país subsequente, só
encontrávamos cerveja em restaurantes turísticos a 4 dólares (ao invés do
índice Big Mac nós temos o índice cerveja local). O Lucio disse uma vez que não
existe caro ou barato, existe o preço do lugar. E é isso, quer quer, não quer,
muda de país.
Precisa de amor, na verdade de muito amor,
para dividir tudo isso com a única companhia da viagem, presente quando você
quer e também quando você não quer. Passar tanto tempo junto torna as
semelhanças e as diferenças bem evidentes, tornando nossas vidas muito mais
emocionante. Conversamos muito, embora às vezes eu ache que não conversamos. É
que é tanto tempo junto que hora ou outra o assunto acaba. Tem dias que não falamos
a mesma língua e dalí pra rolar um estresse e uma conversa básica sobre a
relação é um pulo. Nesses dias é melhor ir dormir porque eu descobri que sempre
tem um dia seguinte e o sol sempre nasce novamente. Mas a verdade é que é com
ele que eu quero estar, dividindo e compartilhando todo esse mundo de
descobertas. Poder rir, chorar, abraçar, brigar, olhar pra lua, olhar pro mar,
olhar pras montanhas, comer nos “pés sujos”, beber cerveja, andar por ai, tudo
isso ao lado dele é a essência da nossa viagem, é o que preenche a minha alma,
fazendo tudo valer a pena.
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Nós 2 curtindo o por do sol, Railay Beach, Tailandia |
Já sinto saudades... e faz tempo. Cada hora
de uma coisa, das pessoas, da comida, da minha casa, de ter uma rotina. Sinto
saudades de conversar com a minha mae tomando um café na cozinha dela, saudades
de beber umas cervejas com o Marques, saudades de dar um abraço no meu pai,
saudades das conversas e da cumplicidade com meus irmãos e cunhados, saudades do
sorriso dos meus sobrinhos lindos, saudades das festas de família na casa da
tia Yaya. A saudade não passa, ela vem e vai. É um choro em silêncio, um aperto
no coração que eu vou aprendendo a lidar.
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Nós 2 curtindo, Santorini, Grecia |
É difícil falar de mudanças em meio a
tantas novidades. Nossos olhares, nossa percepção de mundo, nossos sentimentos
estão a toda prova, trazendo novas referencias e novos significados dia após
dia. Estamos enfim cuidando da nossa alma, nos permitindo descobrir o mundo e a
nós mesmos. E o melhor disso tudo? Ainda temos mais 6 meses pela frente.